"Depravação total" Por Frankle Brunno



A depravação total é uma doutrina teológica derivada do conceito agostiniano de pecado original. Segundo esta doutrina, o homem não regenerado é absolutamente escravo do pecado. Em virtude disto, ele é totalmente incapaz de exercer sua própria vontade livremente para salvar-se. Assim, no que diz respeito à salvação, este homem depende da obra de Deus, que deve vivificá-lo a fim de que este possa ser salvo. A doutrina da depravação total é amplamente defendida por várias correntes teológicas, entre elas o arminianismo, calvinismo, luteranismo e metodismo.

A depravação total é o primeiro dos Cinco Pontos do Calvinismo. A saber, as cinco doutrinas são:

– Depravação Total (Total Depravity)
– Eleição Incondicional (Uncondicional Election)
– Expiação Limitada (Limited Atonement)
– Graça Irresistível (Irresistible Grace)
– Perseverança dos Santos (Perseverance of the Saints)

Depravação Total no arminianismo:

A doutrina da Depravação Total no arminianismo, em nada se difere do ponto de vista calvinista. Era defendida por Jacó Arminío em sua principal trabalho, As Obra de Armínio:

"Em seu estado pecaminoso e caído, o homem não é capaz de e por si mesmo, quer seja pensar, querer ou fazer o que é, de fato, bom; mas é necessário que seja regenerado e renovado em seu intelecto, afeições ou vontade e em todas as suas atribuições, por Deus em Cristo através do Espírito Santo, para que seja capaz de corretamente compreender, estimar, considerar, desejar e realizar o que quer que seja verdadeiramente bom.” 

Foi defendida também pelos remonstrantes, sendo encontrada no terceiro artigo da remonstrância:

Artigo III - Que o homem não possui por si mesmo graça salvadora, nem as obras de sua própria vontade, de modo que, em seu estado de apostasia e pecado para si mesmo e por si mesmo, não pode pensar nada que seja bom – nada, a saber, que seja verdadeiramente bom, tal como a fé que salva antes de qualquer outra coisa. Mas que é necessário que, por Deus em Cristo e através de seu Santo Espírito, seja gerado de novo e renovado em entendimento, afeições e vontade e em todas as suas faculdades, para que seja capacitado a entender, pensar, querer e praticar o que é verdadeiramente bom, segundo a Palavra de Deus [João 15.5].

A depravação total é ensinada em toda a Bíblia:


Gênesis 6.5-6: "E viu o SENHOR que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente. Então arrependeu-se o SENHOR de haver feito o homem sobre a terra e pesou-lhe em seu coração."


Gênesis 8.21: "E o SENHOR sentiu o suave cheiro, e o SENHOR disse em seu coração: Não tornarei mais a amaldiçoar a terra por causa do homem; porque a imaginação do coração do homem é má desde a sua meninice, nem tornarei mais a ferir todo o vivente, como fiz."


Jó 4.17: "Seria porventura o homem mais justo do que Deus? Seria porventura o homem mais puro do que o seu Criador? Eis que ele não confia nos seus servos e aos seus anjos atribui loucura; quanto menos àqueles que habitam em casas de lodo, cujo fundamento está no pó, e são esmagados como a traça!"


Jó 14.4: "Quem do imundo tirará o puro? Ninguém."


Salmo 51.5: "Eis que em iniqüidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe."


Salmo 58.3: "Alienam-se os ímpios desde a madre; andam errados desde que nasceram, falando mentiras."


Provérbios 20.9: "Quem poderá dizer: Purifiquei o meu coração, limpo estou de meu pecado?"


Eclesiastes 9.3: "Este é o mal que há entre tudo quanto se faz debaixo do sol; a todos sucede o mesmo; e que também o coração dos filhos dos homens está cheio de maldade, e que há desvarios no seu coração enquanto vivem, e depois se vão aos mortos."


Jeremias 13.23: "Porventura pode o etíope mudar a sua pele, ou o leopardo as suas manchas? Então podereis vós fazer o bem, sendo ensinados a fazer o mal."


Jeremias 17.9: "Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e perverso; quem o conhecerá?"


Daniel 4.35: "E todos os moradores da terra são reputados em nada, e segundo a sua vontade ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem possa estorvar a sua mão, e lhe diga: Que fazes?"


Marcos 7.21-23: "Porque do interior do coração dos homens saem os maus pensamentos, os adultérios, as prostituições, os homicídios, os furtos, a avareza, as maldades, o engano, a dissolução, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura. Todos estes males procedem de dentro e contaminam o homem."


João 1.12-13: "Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome; os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus."


João 3.3,5-8,18: "Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus [...] Jesus respondeu: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e do Espírito, não pode entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito. Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo. O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito [...] Quem crê nele não é condenado; mas quem não crê já está condenado, porquanto não crê no nome do unigênito Filho de Deus."


João 5.40: "E não quereis vir a mim para terdes vida."


João 6.44,65: "Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou o não trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia [...] E dizia: Por isso eu vos disse que ninguém pode vir a mim, se por meu Pai não lhe for concedido."


João 15.5: "Eu sou a videira, vós as varas; quem está em mim, e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer."


Romanos 3.10-18: "Como está escrito: Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; Não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só. A sua garganta é um sepulcro aberto; Com as suas línguas tratam enganosamente; Peçonha de áspides está debaixo de seus lábios; cuja boca está cheia de maldição e amargura. Os seus pés são ligeiros para derramar sangue. Em seus caminhos há destruição e miséria; e não conheceram o caminho da paz. Não há temor de Deus diante de seus olhos.~


Romanos 5.12: "Portanto, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim também a morte passou a todos os homens por isso que todos pecaram."


Romanos 8.7-8: "Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser. Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus."


I Coríntios 2.14: "Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente."


I Coríntios 4.7: "Porque, quem te faz diferente? E que tens tu que não tenhas recebido? E, se o recebeste, por que te glorias, como se não o houveras recebido?"


II Coríntios 3.5: "Não que sejamos capazes, por nós, de pensar alguma coisa, como de nós mesmos; mas a nossa capacidade vem de Deus."


Efésios 2.1-3,8-9: "E vos vivificou, estando vós mortos em ofensas e pecados, em que noutro tempo andastes segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe das potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência. Entre os quais todos nós também antes andávamos nos desejos da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos por natureza filhos da ira, como os outros também [...] Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie."


Efésios 4.17-19: "E digo isto, e testifico no Senhor, para que não andeis mais como andam também os outros gentios, na vaidade da sua mente. Entenebrecidos no entendimento, separados da vida de Deus pela ignorância que há neles, pela dureza do seu coração; os quais, havendo perdido todo o sentimento, se entregaram à dissolução, para com avidez cometerem toda a impureza."


Efésios 5.8: "Porque noutro tempo éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor; andai como filhos da luz."


Colossenses 2.13: "E, quando vós estáveis mortos nos pecados, e na incircuncisão da vossa carne, vos vivificou juntamente com ele, perdoando-vos todas as ofensas."


II Timóteo 2.25: "Instruindo com mansidão os que resistem, a ver se porventura Deus lhes dará arrependimento para conhecerem a verdade, e tornarem a despertar, desprendendo-se dos laços do diabo, em que à vontade dele estão presos."


Tito 1.15: "Todas as coisas são puras para os puros, mas nada é puro para os contaminados e infiéis; antes o seu entendimento e consciência estão contaminados."


Quando Adão e Eva pecaram, eles caíram do seu estado de justiça (ou retidão) original para um estado de corrupção espiritual, moral, emocional e física. Nossos primeiros pais “se tornaram mortos em pecados e inteiramente corrompidos em todas as suas faculdades e partes do corpo e da alma” (Confissão de Fé de Westminster 6.2). A culpa deste “pecado original” foi imputada, e a resultante corrupção da alma e do corpo, foi transmitida para todos os seus descendentes naturais.


Esta corrupção herdada é descrita como “depravação total”, proveniente da palavra em Latim “depravatio”, que significa a “perversidade” (“pravitas”) que está enraizada nos nossos corações e alcança cada um dos aspectos do nosso ser e da nossa vida. Nós manifestamos os frutos desta depravação em nossas vidas todo dia: “o pecado sempre jorra desta depravação como água corrente de uma fonte contaminada” (Confissão Belga, artigo 15).



A Palavra de Deus para Jeremias identifica esta “fonte contaminada” como o coração do homem, significando a sede do nosso intelecto, vontade e emoções, ou seja, tudo o que nos faz distintamente humanos, forma as nossas personalidades, e determina a nossa conduta externa (Jeremias 17:1,9). O pecado não pode ser culpado por causa do meio, da repreensão, da educação, ou por causa dos mal exemplos que os outros nos concedem. Nós somos pecadores no próprio coração.



Isto não significa dizer que os seres humanos são tão perversos quanto eles podem ser. Na bondade de Deus, “há no homem depois da queda um resto de luz natural. Assim ele retém ainda alguma noção sobre Deus, sobre as coisas naturais e a diferença entre honrado e desonrado e pratica um pouco de virtude e disciplina exterior”. Esta luz natural é, contudo, limitada, e explica apenas porque o homem não é mais perverso do que já, uma vez que o homem caído “não a usa apropriadamente nem mesmo em assuntos cotidianos” (Cânones de Dort, capítulos III-IV, artigo 4).



Sem a restrição da “luz natural”, a raça humana iria rapidamente destruir a si mesma. Nós somos propensos, por natureza, a odiar a Deus e ao nosso próximo (Catecismo de Heidelberg, Q.6). Nós desafiamos o Deus vivo, vivendo a vida de nossa própria maneira, e fazendo guerra uns com os outros. Então, a “escuridão natural” coexiste paralelamente com a “luz natural”, em nós.

Significativa em profundidade, a depravação humana é abrangente em seu alcance e efeitos. Nenhuma parte do nosso ser, em nenhum momento da nossa peregrinação terrena, em nenhuma faceta da vida e do trabalho neste mundo, em nenhum relacionamento com homem ou com Deus, em nenhum dos nossos pensamento, sentimentos, palavras, ou ações, é preservada não corrompida ou isenta da nossa depravação.



Novos Cristãos descobrem rapidamente que a depravação, como “a lei do pecado” em seus membros, ainda guerreia contra a “lei” das suas mentes, ou seja, contra as coisas que eles conscientemente crêem e sabem ser a vontade de Deus para as suas vidas (Romanos 7:23). Eles falam como Paulo: “Então, ao querer fazer o bem, encontro a lei de que o mal reside em mim” (Romanos 7:21).


O remédio de Deus para a depravação total do Seu povo é a salvação tripla em Cristo. Primeiro, em regeneração, novidade de vida é implantada no crente. Segundo, pelo processo de santificação, este nova vida é nutrida, incrementada, e tornada frutífera. Terceiro, é trazida à perfeição final (ou glorificação) na morte, quando a alma do crente é tornada perfeita, e assim, no último dia, o seu corpo será ressurreto à semelhança do corpo glorioso do Cristo ressurreto.



O nosso conforto, enquanto isto, é saber que nossos pecados são perdoados em nome de Cristo, e as nossas enfermidades remanescentes são cobertas por Sua paixão e morte. Estas enfermidades incluem fraqueza ou debilidade de compreensão no que diz respeito ao conhecimento da verdade; fraqueza ou debilidade na fé face a dúvidas e dificuldades; e fraqueza ou debilidade na vontade, no que diz respeito a obedecer os mandamentos de Deus e resistir às tentações para pecar. Todas estas enfermidades são cobertas pela concessão e imputação da justiça de Cristo ao crente, “como se eu nunca tivesse cometido pecado algum ou jamais tivesse sido pecador; e, como se pessoalmente eu tivesse cumprido toda a obediência que Cristo cumpriu por mim” (Catecismo de Heidelberg, Q.60).​






Notas e referências:

Da Circuncisão Física À Doutrina do Arrependimento. pag. 408
KLEBER MAIA, Depravação total. Depravação total. [S.l.: s.n.], 2015. ISBN 978-85-8088-158-5
Jacó Armínio. AS OBRAS DE ARMÍNIO. [S.l.: s.n.], 2013. ISBN 9788526313040
Joel Beeke - The Reformation Heritage KJV Study Bible
Obs: Todas as referências bíblicas são da versão Almeida Corrigida e Fiel.





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