O exótico protestantismo de Contra-Reforma
Há sinais, práticas e ensinos (autóctones ou importados) em igrejas evangélicas brasileiras hoje que, de certo, causariam tristeza, revolta ou desalento aos reformadores, que até os levariam às lágrimas, exclamando: “Não era bem isso o que nós queríamos!”.
Tais sinais ora representam retrocessos, ora representam inovações no cerne das doutrinas reformadas.
Seriam retrocessos: a) o centralismo, o clericalismo, o hierarquismo, que atentam contra um dos pilares do protestantismo: a doutrina do sacerdócio universal dos crentes; b) o tradicionalismo, que atenta contra o princípio protestante da subordinação da tradição às Escrituras; c) a redemonização do mundo, que atenta contra os princípios reformados da vitória da cruz e do ministério dos anjos; d) o sectarismo denominacionalista, que nega a reafirmação reformada de ser a igreja uma, santa, católica e apostólica; e) o isolacionismo, que atenta contra o ensino reformado da santidade ativa no mundo; f) o ascetismo legalista, que atenta contra a postura reformada da liberdade e da licitude do prazer, como dádivas de Deus.
Ensinos como batalha espiritual, demônios geográficos, demônios familiares, maldições hereditárias, apagamento erótico, rosa ungida etc. trariam sofrimento e dor nos reformadores, sempre preocupados com a simplicidade e a sobriedade da vida cristã.
Seriam inovações: a) tanto a rigidez quanto a anarquia litúrgica, quando ora se fecha ao sopro renovador do Espírito Santo, ora se abandona, iconoclasticamente, toda a rica herança da adoração da igreja; b) a teologia da prosperidade, que agride a memória dos mártires e produz riscos ao discipulado; c) a teologia do domínio, que nega o chamado cristão ao serviço sacrificial; d) a alienação política ou adesismo, contrários à crença reformada na doutrina dos “dois reinos” e ao chamado ao profetismo; e) a insensibilidade social, em contraste às obras de misericórdia, que eram componentes centrais do ensino e vida dos reformadores; f) o preconceito ao conhecimento científico, particularmente às ciências humanas, que confunde ignorância com santidade, enquanto que os reformadores detinham títulos de doutores e fundaram universidades.
Proibições de bater palmas ou usar determinados instrumentos musicais na igreja, “louvorzões” superficiais e verticalistas, sopros e paletós derrubadores, unções sobre talões de cheques, promoção de privilégios, bajulação aos poderosos, ausência de senso crítico trariam espanto e lamento aos reformadores, advogados de uma concepção integral de missão da Igreja e exemplos de vivência inculturada da fé.
A crescente adesão acrítica de muitas igrejas evangélicas aos “encontros de casais com Cristo” implica, talvez por desconhecimento, inegável adesão à doutrina católica romana tradicional sobre sexualidade e família, e um abisal distanciamento dos questionamentos e pontos de vista dos reformadores.
Não pretendemos atribuir aos ensinos dos reformadores status canônico, mas sua lealdade à Palavra nos permite aprofundá-los, ampliá-los, atualizá-los, nunca negá-los, voltar atrás nem deles nos afastar. Diante desse quadro, a unidade cristã fica mais difícil, e os segmentos que levam a sério a Reforma deverão aprofundar a sua caminhada, mesmo solitários e incompreendidos.
Castelo forte é o nosso Deus!
fonte: A igreja, o país e o mundo (Desafio a uma fé engajada) por Robinson Calvalcanti, publicado pela editora Ultimato.
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